quinta-feira, 24 de junho de 2010

Sobre não-aprender.

- Comecei a ler "A Microfisica do Poder", Michel Foucault, e estou lendo "E por que não?", da prof. Amnéris, daqui IFCH. Dessas leituras, das aulas de Teoria da História, das experiências desse semestre, e tantas outras coisas que não faz sentido enumerar, senti a necessidade de expor algo que penso a bastante tempo: Não se ensina, são as pessoas que aproriam-se dos encontros, na medida em que eles significam para elas. Aprendizagem é do "aprendente" e não do "ensinador".


Eu ensino a alguem? Algum individuo é capaz de "passar" algo ao outro? Conhecimento , conselho, informação?

Minha primeira resposta seria que sim, mas quando entro nos meandros que envolvem falar e ouvir, na relação que se estabelece entre a parte que diz e a parte que ouve, percebo novas variaveis. Percebo que ouvimos melhor aquilo que nos diz "mais proximo" - ouço melhor sobre kung fu, história e rpg, do que ouço sobre gramática da lingua portuguesa, ou moda, ou sobre o carro do ano. Há em mim um conjunto de significados e coisas, um conjunto de experiências, que orienta a forma como eu ouço o mundo - no limite, como percebo o mundo.
Não se trata sobre uma reflexão pessoal do meu ser, mas uma reflexão, baseada na minha experiência, sobre a percepção humana do humano. Aprender sobre ou o mundo está ligado a percebe-lo, a senti-lo - percebemos melhor o mundo que nos "diz mais", que se encontra mais proximo da nossa experiência, no sentido de que , quanto mais intima é minha relação com as coisas sobre as quais dizem, ou ainda com as pessoas que dizem, melhor serei capaz de ouvir, aprender.
Do contato, do encontro, as experiências daquele "outro", que expressadas muitas vezes na fala, mas podem ser expressas de inumeras maneiras, podem ganhar significado a partir a identificação com a experiência do "eu" - e assim o "eu" consolida uma nova "coisa", uma forma de pensar sua relação, ou a si próprio, um "conhecimento no sentido mais amplo possivel, que pelo significado que possui, para si (para o "eu"), faz dessa coisa, coisa própria.

Sendo assim, eu não acredito que ninguem seja capaz de "passar" nada a ninguem. Acredito ninguem ensina ninguem. Nos apropriamos das coisas que nos fazem sentido, ou ainda, que nos fazem sentir.
Só existem esses encontros, de experiências de dimensões humanas diferentes, de seres humanos diferentes, que nesses momentos tem uma oportunidade de compartilhar. E a partir dessa relação uma oportunidade de criação - de todo tipo de natureza.

Qualquer encontro de individuos é um encontro de universos. A complexidade da dimensão humana, é equivalente a complexidade do Universo - quando se encontram, carregam em si as relações que estabeleceram com tudo - desde as culturas nas quais foram educados, como construiram sua forma de pensar, com a própria Terra. Esses universos-humanos, compartilham de percepções comuns -porque suas experiências se dão num mundo comum, assim compartilham de identidades, campos comuns, experiências semelhantes (por exemplo: ambos pularam de paraquedas alguma vez), ou foram educados no mesmo pais e no limite daquilo que se pode pensar diferente: compartilham de uma identidade do mundo - Habitam a Terra.

Sendo assim, penso o conhecimento como uma dimensão da completude do ser. Aquilo que me diz não é só aquilo que me identifico, mas também aquilo que " não tenho em mim", algo sobre o qual "não pensei", mas pelo encontro sinto (percebo) e a partir disso penso. É possivel pensar nessa hipotese tanto pelo ponto de vista do aprendizado afetivo do mundo, quando do lógico, cognitivo, "dos conhecimentos" - creio que para a experiência humana, muitas vezes aprender a matemática é tão significativo quando fazer um amigo, conhecer a dor de se cortar, quebrar um osso, ou do frescor da água quando se tem muita sede, muitas vezes é semelhante, a descoberta de uma lógica da gravidade universersal, e a descoberta dos movimentos do próprio corpo.

Assim, podemos pensar também, que não existe essa diferença "conhecimento afetivo" , "conhecimento cognitivo", essas são categorias arbitrárias, que separam os conhecimentos que creem ser da "ordem da razão", e aqueles que creem ser da "ordem dos sentidos", até mesmo porque , na experiência das pessoas, elas efetivamente existem?

Nessa linha de pensamento, não é possivel "conscientizar" ninguem. Nem "passar nada", não existe um método, é a forma como os encontros acontecem entre as pessoas, e as condições que estabelecem este encontro.
Reaprender a ouvir o mundo. É repensar-se dentro da condição humana - que considero incapaz de "entender" o mundo. Que vive dentro de uma dimensão incapaz de compreender "o todo", e assim, revalorizar a experiência do mundo sensivel, e as relações que cada um dos individuos estabelece ao longo de suas vidas, afim de assim, propor novas formas - do pensamento e das coisas.

Como fica então a relação entre o aluno e o professor? Penso, que partindo dessas idéias, seja necessário reformular quase tudo que se pensa a respeito de educação, mas começando pela relação aluno-professor. Na sala de aula o professor está numa tal posiçao de poder, que favorece a recepção dos alunos - por mais que não pareça. Ali, as crianças transparecem seus aspectos mais sinceros, e boa parte de toda a energia que não podem dar fim - que lhes é tolhida. Esse meio tão permeado de relações de poder tão discutiveis e tão significativas aos seus alunos pode ser aproveitado.
Assim, ao invez de um "senhor da verdade", que sobe ao pulpito para ensinar aos "que não detem a luz", o professor se investe de outro carater: sua função é aproximar, é tocar, encostar, afetar - se possivel angustiar - seus alunos, trazer encontros que proporcionem reflexões, àquelas tantas diversidades humanas, em um estagio de formação "vulcânico" (cheio de energia!) , usar dessa energia, do significado das coisas, do sentido que elas possuem, para dar potencia a razão. Para isso é fundamental que o professor saiba "ouvir" os universos de seus alunos, dentro daquilo que é próprio de suas individualidades e daquilo que é mais geral de um grupo, e assim, utilizar-se daquilo que "diz muito" a esses pequeninos humanos, proporcionar-lhes encontros que possibilitem dar sentido as coisas, "aprenderem" mundos.

Ensinar se torna o ato de proporcionar encontros que permitam a construção do ser, e a possibilidade de ser, e conhecimento aquilo que se constroi "nos encontros de mundos".


É notorio que as atuais condições da escola brasileira, as condições do trablho do professor, as condições do aluno na escola, e a estrutura de poder dentro da instituição escolar, representam um enorme obstaculo a propagação, desta idéia, mas eu acredito que valha apena ir adiante com o projeto e arriscar.
Penso ser mais coerente acreditar nessa idéia de Educação, tantas vezes chamada de Utopia, do que acreditar no atual estado de coisas.




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