domingo, 14 de dezembro de 2014

Harle...

Eu contei a história de um pássaro outro dia. Creio que você teria gostado (especialmente do pássaro). Era pra dizer de como me impressiona, a rapidez, ou a surpresa com que a Morte vem e passa e leva consigo alguém. Naquele dia, aquele pássaro. Nem eu, nem ele esperávamos... Como normalmente, e vivemos, as pessoas de uma maneira geral, alheios à possibilidade da morte. Não que acredite que devamos viver com medo da morte, mas é um exercício acostumar-se com a perspectiva de que pode ocorrer, de que não sabemos quando irá ocorrer e pode ocorrer a qualquer um...

Me lembro de uma vez que ouvi, acerca de uma meditação que se faz sobre a morte, que ajuda encararmos melhor nosso dia. Nos dizemos, repetidas vezes, "talvez eu morra hoje." O objetivo não é criar desespero, mas nos atentar à percepção de que qualquer hoje é um hoje possível de se morrer...

Na época que dei aulas em Campinas, antes de ir para a escola, devido ao estresse de andar tanto tempo de ônibus e do cansaço, meu humor as vezes ficava muito ruim. Então, passei a praticar isso no trajeto, e à medida que eu ia me alinhando com a possibilidade que talvez esse fosse meu último dia dessa forma, então, evitava gritar com as pessoas, descontar nos meus alunos minhas amarguras, ou no trocador do ônibus ou em alguém que sentasse ao meu lado... Passava a prestar-lhe mais atenção, uma vez que... poderia ser que não nos vissemos mais, eu e e qualquer uma das pessoas que encontrasse.

Minha mente não era tomada por melancolia, mas por realidade. Não estava triste, mas como estava consciente da possibilidade, queria não "ir embora" mal com ninguém.

É um exercício que eu ainda tento praticar as vezes. Nem sempre consigo. Não basta pensar a frase, é preciso estar nesse pensamento, é preciso que sua consciência se alinhe com aquilo e seus gestos, a forma como você vê as situações acaba mudando, ou você pelo menos, se abre a possibilidade de que mudem...

Para você, no entanto.. essas palavras teriam sido enfadonhas, você teria corrido pro quintal e saltado o muro. E ido aonde bem entendesse... se essas palavras eu estivesse dizendo, aposto, como aposto, que você não diria nada, no máximo sairia, majestoso, como de costume.

Vou sentir falta de seus gestos ágeis, de como era forte, grande e belo.

Se faltar espaço n'outro lugar pra correr, há muito espaço aqui na minha alma por onde você sempre poderá correr, talvez, até perseguir aquele pássaro que caiu outro dia...

Longe do alcance daqueles que te fizeram mal.



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